quinta-feira, 7 de novembro de 2013

A Esperança Enterrada

As paredes novamente pareciam fechar-se sobre ela. Sem janelas nem frestas, nada que pudesse lembrar que um dia o sol brilhara. Suas unhas roídas, suas mãos ensanguentadas ainda tentavam inutilmente cavar. E cavavam. Cavavam. Cavavam incansavelmente em busca de um brilho de esperança, uma pequena corrente de ar, algo que pudesse faze-la acreditar que ainda havia vida!
Seus olhos. Não sabia dizer se estavam abertos ou fechados, pois a escuridão era sua única visão. Podia sentir suas mãos, rasgadas e ensanguentadas, mas não sentia dor, e isso era de certa forma reconfortante.
Não podia dizer a quanto tempo estava ali, mas nas poucas vezes que adormecia, sonhava com uma colina verdejante,  com ondas batendo num rochedo, sentia a brisa vinda do mar, o cheiro da floresta de carvalhos e um brilho âmbar que, embora lhe trouxesse paz, não podia identificar. Era um raro momento de tranquilidade.
Mas logo as paredes tornavam a sufocá-la, as pedras pareciam facas ao tocarem sua pele, o odor forte de enxofre fazia suas narinas arderem e seus olhos lacrimejarem, mas ela não podia desistir.
E foi assim, cavando, sangrando, e chorando que o encontrou. Ele estava adormecido sob as pedras mais profundas. Parecia uma estátua, um fóssil, perdido no meio do caos. Mas bastou sua mão tocar-lhe a pele áspera e fria para que aqueles grandes olhos amarelos se abrissem e um suspiro quente saísse por suas narinas. O susto fez com que ela caísse, tropeçando nas pedras pontiagudas que lhe abriram um grande corte na coxa, mas antes que pudesse chorar ou sentir qualquer coisa, viu os grandes olhos amarelos fixarem os seus. Ele era grande, imenso, com o corpo cheio de escamas de uma cor azul com tons acobreados, tinha garras e asas, mas seus olhos... seus olhos eram doces e tranquilos. 
Com um cuidado digno de um lord, ele lambeu sua ferida, colocou-a em seu dorso e, como num sonho, abriu suas grandes asas que quebraram as paredes como se fossem de papel e num único impulso alçou voo.
E subiram. Subiram o mais alto que puderam. Ela sentia o vento fresco tocar seu rosto, a pele áspera sob suas coxas, o balanço de seu corpo cada vez que suas asas se inclinavam, era uma sensação de incrível liberdade, uma alegria extasiante! Seu coração parecia saltar do peito.
Neste momento decidiu olhar para baixo, para os restos das paredes derrubadas. E lá. Bem lá embaixo. Entre pedras e destroços, restos de uma vida, ela viu, estupefata, seu corpo dilacerado.